Ação em imóveis usados pelo crime organizado na Cracolândia — Foto: Giba Bergamim/TV Globo
Ministério Público (MP), Receita Federal, Polícia Militar (PM), Polícia Civil, Polícia Federal (PF) e Ministério Público do Trabalho (MPT) realizam na manhã desta terça-feira (6) uma megaoperação na Cracolândia, no Centro de São Paulo, para prender três guardas-civis metropolitanos, um ex-agente da Guarda Civil Metropolitana (GCM) e dois traficantes de drogas.
Segundo a investigação, os guardas e o ex-guarda são suspeitos de integrarem uma milícia acusada de extorquir dinheiro de comerciantes na Cracolândia, região conhecida pela venda e consumo de drogas. Além disso, um casal de traficantes é suspeito de participar da venda de armas ilegais e de cometer exploração sexual e da prostituição (saiba mais abaixo).
A Operação Salus et Dignitas (saúde e dignidade) começou por volta das 9h. Promotores e policiais saíram às ruas para tentar cumprir sete mandados de prisões preventivas contra três guardas-civis, um guarda--civil aposentado, dois traficantes e um funcionário de uma empresa.
Até às 9h40, um dos alvos havia sido preso pelas forças de segurança. Trata-se de Leonardo Moja, o "Léo do Moinho". Ele é apontado como um dos chefes da facção criminosa Primeiro Comando da Capital (PCC) na Favela do Moinho, na região da Cracolândia. Em 2021 ele já havia sido preso pela polícia em Praia Grande, litoral paulista, por suspeita de homicídios.
Além dos mandados judiciais de prisões, a operação pretende cumprir 117 mandados de busca e apreensão na capital paulista em endereços ligados aos investigados. A Justiça também expediu 46 de sequestro e bloqueio de bens e suspensão de atividade econômica de 44 prédios comerciais.
"Além da perda da licença, os imóveis serão lacrados pelas autoridades municipais para garantir que a atividade ilícita não volte a acontecer no local", informa nota da Secretaria da Segurança Pública (SSP).
Em um ano de investigação, promotores do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco) do MP e policiais identificaram que a quadrilha se dividia em cinco grupos de atuação na Cracolândia:
- Ferros-velhos: empresários são suspeitos de explorar mão-de-obra de dependentes químicos. Os usuários furtavam fios de energia da rede pública, deixando semáforos e postes sem luz, e trocavam o cobre presente neles por drogas. Nesses locais foram encontrados crianças e adolescentes participando desse comércio irregular;
- Milícia de GCMs: GCMs, policiais militares e policiais são suspeitos de se articularem numa milícia para extorquir dinheiro de comerciantes em troca de proteção. De acordo com a investigação, o grupo chegou a conseguir cerca de R$ 6 milhões em propina no período de quase um ano;
- Receptação de celulares: comerciantes libaneses são suspeitos de montarem um esquema de receptação de celulares roubados e furtados e depois revender as peças. Os celulares eram levados a eles por grupos criminosos como as 'gangues da bicicleta' (que usam as bikes para fugir depois de roubar e furtar telefones de pedestres);
- Hotéis e hospedarias: rede de hotéis e hospedarias mantida pela facção criminosa Primeiro Comando da Capital (PCC) servem para armazenar drogas e abrigam até tribunais do crime. Além disso, dentro deles acontecia a exploração sexual de mulheres que eram obrigadas a se prostituir para comprar drogas. Há denúncias da presença de menores de 18 anos de idade sendo exploradas. Um dos imóveis é conhecido como 'prédio do sexo' onde ocorria a exploração da prostituição. Maiores de idade se prostituírem não é crime, mas explorar a prostituição é;
- Favela do Moinho: a comunidade erguida ao lado da linha da Companhia Paulista de Trens Metropolitanos (CPTM) se tornou uma base do PCC. Dali saem as ordens para a tráfico de drogas na Cracolândia. A favela também serve como depósito de armas e drogas. Segundo a investigação, criminosos usavam um detector de radiofrequência para ouvir as conversas operacionais da PM e, desse modo, se anteciparem às operações. E para terem controle da comunidade realizavam 'tribunais do crime', que são julgamentos feitos pelos criminosos para punirem seus membros e até moradores que descumprissem regras internas.
- Em postagem nas redes sociais, o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, que acompanhou a ação de dentro de um dos helicópteros da PM, não comentou sobre o envolvimento de servidores públicos, que atuam como milicianos e têm relação com crime organizado e são os principais alvos da operação. Disse, apenas, que ação visa "devolver o centro às pessoas".
Ação das forças de segurança para combater milícia de GCMs e presença de traficantes na Cracolândia — Foto: Giba Bergamim/TV Globo
Os investigadores apontaram que foi possível “qualificar a região central de São Paulo como um ecossistema de atividades econômicas ilícitas, no qual as organizações criminosas concorreriam para que o Primeiro Comando da Capital (PCC) exerça poder de influência e controle sobre a ocupação e exploração do território.”
O objetivo da operação é desarticular esses esquemas criminosos, que, na visão dos promotores, contribuem para perpetuar o fluxo (grupo de dependentes químicos que usam crack nas ruas).
A decisão do juiz Leonardo Valente Barreiros, da 1ª Vara de Crimes Tributários, Organização Criminosa e Lavagem de Dinheiro, estabelece um habeas corpus coletivo (salvo conduto) em favor dos dependentes químicos durante a operação. Quem portar até 20 pedras de crack ou estiver em situação de miséria não poderá ser preso em flagrante. O juiz afirma que isso visa proteger a dignidade humana.
Agentes das forças de segurança se reúnem para tratar de operação contra milícia de GCMs e traficantes do PCC — Foto: Divulgação
Fonte: g1