Thiago, João e Camila se encontraram na parada de ônibus não muito longe da escola onde estudavam. A tarde de 1º de abril, uma terça-feira, estava abafada em Caxias do Sul, mas sem chuva, e eles tinham uma tarefa a cumprir antes do sinal de entrada, às 13h30, na Escola Municipal João de Zorzi.
Perto do ponto às margens da avenida, entre edificações e áreas de mata, Thiago, de 15 anos, mostrou as quatro facas que havia trazido de casa e estavam na mochila. João, de 14, também havia levado uma. Os dois dividiram as armas entre si e entregaram uma a Camila, de 13.
O trio entrou pelo portão da escola, sem levantar suspeitas. Chegaram a exibir discretamente as facas a alguns colegas.
"Eles falaram que iam matar a professora, mas a gente achou que era brincadeira", relatou um estudante à BBC News Brasil.
De fato, era dia da mentira, mas os planos dos adolescentes, que tiveram seus nomes trocados para proteger suas identidades, eram reais e mudariam os rumos daquela tarde no bairro de Fátima Baixo.
Na 71, uma das salas do sétimo ano, Thiago, João e Camila atacaram a professora de inglês pelas costas com uma sequência brutal de golpes, seguindo o que havia sido planejado pelo trio em um grupo no Instagram dias antes.
A aula da professora Luana (seu nome também foi alterado) havia começado um pouco antes. Um dos alunos já havia desligado a câmera da sala de aula da tomada e guardado na mochila. Outro foi, então, fechar a porta.
"Deixa aberta, que tá muito calor aqui dentro", teria dito a professora de 34 anos enquanto distribuía os livros didáticos, segundo um relato feito à reportagem.
Ao chegar à frente de sua mesa, ela recebeu o primeiro golpe de João.
Em seguida, Thiago desferiu mais golpes, mesmo após Luana cair no chão. Ele deixaram ao menos 13 ferimentos a faca em Luana, de acordo com o laudo pericial.
Thiago havia entregue uma das facas a Camila, segundo seu depoimento à polícia, mas, no último minuto, ela não participou diretamente do ataque.
Entre gritos, choro e desespero, os alunos da turma 71 saíram correndo.
"Mataram a profe", gritavam.
"Eu queria ajudar a professora, mas eles estavam em cima dela. Ficou essa cena da professora jogada no chão, cheia de sangue e pedindo socorro", disse uma testemunha em entrevista à reportagem.
"A gente não pôde fazer nada. Eles podiam ameaçar a gente ou fazer coisa pior", seguiu o estudante, que pediu para ter sua identidade preservada.
O vice-diretor da escola, Gabriel Jean Boff, estava em frente a um dos portões. No meio da confusão, ouviu pessoas gritando que "estavam matando gente".
Boff diz ter visto o pavor nos rostos dos adolescentes e entendido que não era uma brincadeira. Foi quando abriu os portões com as barras antipânico e orientou os alunos a saírem.
Outro grupo correu para salvar a professora de inglês, que caiu ferida entre as carteiras com tampo de madeira pintados de branco. Gritaram por socorro na Unidade Básica de Saúde (UBS) que fica colada na escola, e receberam ajuda de uma enfermeira.
"Foi uma série de golpes que mostra ódio e raiva nos adolescentes que estavam praticando esse ato, o que para nós é incompreensível e que acabou lesionando ela em diversas partes do corpo", diz Leonel Ferreira, advogado da professora, que sobreviveu e está afastada da função por tempo indeterminado.
"Acho importante destacar a ausência de qualquer ameaça anterior, qualquer aviso ou qualquer informação de que pudesse acontecer alguma coisa. E mais do que isso, não houve com a professora nenhum tipo de conflito prévio", completa Ferreira.
Por que o ataque? O que levou ao crime com 13 facadas na João de Zorzi? O que poderia ter sido feito para evitar a tragédia?
Desde 1º de abril, são essas algumas das perguntas em Caxias do Sul, a 125 km de Porto Alegre. As autoridades policiais, administradores da escola, mas também as famílias, os alunos, os professores dentro e fora da unidade estão em busca de respostas.
A BBC News Brasil viajou até a cidade gaúcha, conversou com 15 pessoas envolvidas no caso e teve acesso a documentos sigilosos da investigação para reconstituir o ataque e seus antecedentes.
A tragédia faz parte de um panorama sombrio de outros 42 casos de ataques que aconteceram em instituições de ensino brasileira desde 2001, segundo relatório de pesquisadoras da Unicamp obtido com exclusividade pela reportagem. Há uma escalada: mais da metade deles ocorreu nos últimos três anos.
A Polícia Civil acaba de encerrar o inquérito do crime da escola de Caxias. Thiago, João e Camila, acusados pelos ataques, seguem privados de liberdade e aguardam julgamento.
Os investigadores não descartam que o rompante violento tenha ligação com grupos externos que incentivam radicalização e ataques de jovens a escolas, mas nada neste sentido foi encontrado ainda. Essa ligação vai ser investigada mais a fundo de agora em diante.
"Não existe conduta que justifique estar uma situação assim, mas poderia ser uma pontinha de um iceberg", diz Aline Martinelli, delegada do caso.
No caos instalado após o ataque, Thiago e João conseguiram fugir para uma área de mata em frente à escola. A mochila com as facas usadas contra Luana foi jogada no local. Camila ficou na João de Zorzi — e seu pai a buscou horas depois.
Os dois rapazes ficaram na mata por quatro horas, até serem encontrados pelas buscas da Guarda Municipal, Brigada Militar e Polícia Civil.
Já em custódia das autoridades, João falou pela primeira vez: disse ter atacado a professora porque ficou "estressado" por ela chamá-lo de "sem futuro".
Na mesma noite do 1º de abril, o Ministério Público estadual ofereceu uma representação à Justiça, que determinou a internação dos adolescentes.
Thiago e João estão na Fundação de Atendimento Sócio-Educativo (Fase) de São Leopoldo, a 95 km de Caxias. Apreendida depois, Camila está na unidade de Porto Alegre, onde fica a única ala feminina para jovens infratoras do Estado.
Foi nos depoimentos à polícia que começaram a se delinear os últimos dias na escola antes do crime. Como o que havia começado como uma indisciplina típica de adolescentes havia se tornado barbárie.
Cinco dias antes, na quinta-feira, 27 de março, João, Thiago e Camila estavam entre os sete alunos da Turma 71 que foram até a Unidade Básica de Saúde que fica ao lado do colégio.
No postinho, pegaram alguns preservativos de distribuição gratuita, levaram para sala de aula e encheram de ar como se fossem bexigas. A bagunça teve uma consequência esperada na vida escolar: os estudantes foram repreendidos e levados à diretoria.
Na manhã seguinte, o diretor da escola, Jeferson Carvalho, decidiu que os pais dos envolvidos deveriam ser chamados para uma reunião na próxima semana. Afinal, não era a primeira vez que os alunos da Turma 71 tinham problemas disciplinares.
Foi naquele mesmo dia, no refeitório da escola, que o destino de Thiago, João, e Camila começou a mudar. Os três repreendidos no incidente das camisinhas começaram a planejar abertamente uma vingança: o assassinato de professores.
"Vou botar fogo neste diretor", teria dito um deles, segundo relato de uma testemunha à BBC News Brasil.
Os estudantes convidaram outros colegas a participar do plano, segundo relatos feitos à reportagem e à investigação policial. A confabulação levou à criação de um grupo chamado "Matadores" no Instagram.
Durante o fim de semana seguinte, foi no grupo que eles orquestraram o ataque, como mostram os registros do inquérito policial ao qual a BBC News Brasil teve acesso.
Nas mensagens, Thiago e João detalham o plano: que armas levariam, como fugiram e até o que comeriam durante a fuga.
"Vamos matar quantos?", perguntou João.
"Quem tiver na frente", respondeu Thiago.
Na véspera, Thiago detalhou: "Nois vai entrar pra sala e daí primeiro período vai ser com a sora [professora] de inglês. Daí como ela é surtada, eu vou em direção a câmera da sala e tiro a câmera".
"Daí nisso tu e a Camila vão em direção a ela dando facadas e daí chego", disse. "Daí nois manda a turma ficar em silêncio porque se não vão morre td [todo mundo]", seguiu.
"Vou virar um serial killer tô nem aí", afirmou Thiago.
"Eu tbm kkk", concordou João.
No Instagram, Thiago publicou em seu perfil aberto, no dia 30 de abril, duas fotos em uma mesma postagem. Na primeira, ele aparecia encapuzado. Na segunda, segurando uma faca. Na legenda, emojis de um ninja e uma gota de sangue.
A maioria dos 32 estudantes da Turma 71 está junta desde o primeiro ano do ensino fundamental. Atravessaram a pandemia entre aulas remotas e retomadas e estavam juntos durante as maiores mudanças da vida da escola João de Zorzi, que passou por uma reforma.
Em fevereiro, iniciaram o ano letivo com a presença do prefeito da cidade, Adiló Didomenico (PSDB), para marcar a volta ao prédio localizado no bairro Fátima Baixo, região periférica de Caxias.
Com cerca de 300 alunos, a escola tem um bloco administrativo, com sala dos professores e direção, e outro de salas de aula. Após a reforma, o prédio está bem cuidado, com paredes externas azuis e duas quadras esportivas pintadas da cor terracota.
A sala da 71 fica no final do corredor do segundo bloco. Era uma turma que se dava muito bem, diz o diretor da escola Jeferson Carvalho
"É uma turma que tinha problemas pedagógicos, como qualquer outra. De fazer brincadeiras, tacar bolinhas. Mas nunca havia tido sequer uma briga entre eles na sala de aula ou na escola", afirma Carvalho.
Mas a algazarra em sala fazia com que esse fosse um grupo difícil de trabalhar, relata uma professora que já deu aula ao grupo no passado e pediu anonimato à reportagem.
"Eram adolescentes bem indisciplinados e muito unidos, mas nada que uma conversa não resolvesse", diz ela.
"Para garantir tua aula, tu tinhas que tomar algumas posturas. Por exemplo, convidar alguns para se retirar era de praxe. Até era algo combinado com a própria direção para garantir a aprendizagem dos que queriam estudar."
Thiago e João já haviam repetido o 7º ano duas vezes. Em casa, eram tranquilos, nunca apresentaram comportamentos violentos, segundo disseram seus familiares à Polícia Civil.
A mãe de Thiago afirmou que o filho obedecia às suas orientações, apesar de já ter acumulado reclamações na escola por conversar demais em sala.
Já os pais de João afirmaram que o filho frequentava a igreja e nunca havia dado sinais de agressividade. O menino costumava passar horas trancado no quarto, jogando no celular, e evitava mostrar o que fazia no aparelho.
As duas famílias também relataram em depoimento desconhecer qualquer plano violento dos adolescentes. A BBC News Brasil entrou em contato com os responsáveis por Thiago, João e Camila, mas eles ou não responderam ou se negaram a conversar com a reportagem.
Na véspera do ataque, na segunda-feira, 31 de março, a pedido do diretor, todos os responsáveis pelos envolvidos na bagunça com balões de camisinha na Turma 71 deveriam ir à escola acompanhados dos filhos.
Quatro responsáveis dos sete estudantes advertidos compareceram, com exceção das famílias de João e Camila.
"Eu disse que precisava da ajuda deles. Falamos com os pais e com os alunos que a gente precisava que eles tivessem consciência de que tais brincadeiras não eram aceitáveis numa sala de aula, em uma escola. Eles acolheram essas demandas", diz o diretor da escola.
Escola passou recentemente por uma reforma; alunos voltaram ao prédio no final do ano letivo de 2024 — Foto: Rutte Pina/BBC
Às 17h35, já bastante atrasado e quase no fim do turno, Thiago chegou com a mãe à escola. Foi recebido pelo diretor.
"Eu disse para ele: 'Pô, cara, você já está há dois anos em defasagem de aprendizagem, repetindo a mesma série. Quem sabe agora tu dá uma baixada na cabeça, pensa no teu futuro. Pensa nas coisas que tu pode adquirir'", lembra Carvalho.
"E a mãe dele sempre dizia que ele não queria nada com nada. E eu disse que ele tinha que ter consciência de que estava crescendo, que precisava se desenvolver e buscar um trabalho digno."
Naquele mesmo dia, segundo uma testemunha que conversou com a reportagem, foi publicado um aviso em um grupo no Instagram, com vários estudantes da escola: "Amanhã se preparem".
À polícia, João disse que o plano inicial era atacar o diretor, como vingança por convocar os pais para a reunião. Mais tarde, o trio decidiu que esfaqueariam "o primeiro professor que aparecesse".
Luana dá aulas de inglês há 18 anos, 5 deles na rede municipal de Caxias do Sul. A escola onde foi atacada não é onde ensina regularmente. Ela complementava sua jornada de trabalho na João de Zorzi com somente uma hora por semana — justamente a hora escolhida para o ataque.
A professora contou, em depoimento, que pensou que um aluno havia pegado o livro distribuído por ela pouco antes e batido com ele em sua cabeça, até perceber que os golpes se repetiam e que estava sangrando.
Gritou por ajuda. Depois de socorrida pela enfermeira da UBS, foi levada a um hospital privado e recebeu alta no dia seguinte.
Desde então, Luana é acompanhada diariamente por uma equipe de enfermagem em casa, além de receber apoio psicológico bancado pela Prefeitura.
"Parte desses atos são irremediáveis. Vão ficar marcas para sempre", diz o advogado da professora, Leonel Ferreira.
Ele diz que não houve nenhuma ameaça ou conflito prévio entre Luana e os estudantes e repete que, para eles, é um ato "incompreensível".
Também para a polícia, a motivação do crime ainda não está clara. A delegada Aline Martinelli, da Delegacia de Proteção à Criança e ao Adolescente e responsável pelo caso, diz que a primeira linha investigatória aponta para uma revolta contra professores e a direção da escola.
"Não descartamos que haja ramificações paralelas. Agora vamos entrar em um segundo momento investigatório para entender se existiam outras pessoas e outras formas de crime."
Segundo a delegada, já havia conflitos anteriores entre os autores e outros estudantes, "o que não justificaria o ato, mas pode ser uma ponta de iceberg".
A delegada Aline Martinelli diz que ataque poderia estar ligado à revolta de adolescentes contra professores e direção da escola — Foto: Rute Pina/BBC
Ela destaca que o ataque poderia ter ocorrido um dia antes. "Poderia ter acontecido na segunda-feira, que seriam outros professores, e só não aconteceu porque um dos apreendidos não foi à aula."
A Polícia Civil obteve os celulares dos adolescentes e identificou o grupo no Instagram, usado para planejar o ataque, e mensagens de ódio, que também eram direcionadas a outros alunos.
"Não se descarta, num primeiro momento, o vínculo com grupos extremistas", diz o promotor de Justiça Adrio Gelatti, que atua no caso, frisando a facilidade de contato entre os adolescentes e os criminosos na internet.
"Em todos os casos de violência extrema em escolas, existe a possibilidade de ter havido incentivo externo, de ideação, de planejamento, de execução. Por isso, em nenhum caso se descarta a conexão com estes grupos."
O promotor acompanha de perto e cita o trabalho do Grupo de Estudos e Pesquisas em Educação Moral (Gepem) da Unicamp, que monitora violência extremista nas escolas e vem mostrando uma escalada no número de incidentes de 2021 para cá.
"O aumento é expressivo", diz Gelatti.
Para as pesquisadoras do Gepem, Telma Vinha e Cléo Garcia, o ataque na João de Zorzi sem dúvida integra as estatísticas que elas acompanham e não deveria ser considerado um caso isolado.
"São múltiplos os fatores para essa alta do número de ataques", diz Garcia. "Os autores estão submersos contexto familiar, cultural e psicossocial que a maioria não fica sabendo. Alguns deles podem ter transtornos não diagnosticados ou negligenciados."
Um estudo atualizado do grupo da Unicamp, obtido com exclusividade pela BBC News Brasil, mostra que ao menos 42 ataques ocorreram entre 2001 e 2024 — mais da metade deles concentrados entre 2022 e 2024.
O levantamento mostra que, entre 2001 e o fim do ano passado, 44 pessoas foram mortas em ataques a escolas no Brasil. Outras 113 ficaram feridas. Mais da metade dos ataques no país foi executada com facas, machados ou coquetéis molotov.
Segundo pesquisa de Vinha e Garcia, os autores são, em sua maioria, adolescentes do sexo masculino, com menos de 18 anos, que estavam matriculados na escola no momento do ataque ou haviam abandonado os estudos. Em comum, apresentam um histórico de sofrimento escolar, isolamento social e vínculos familiares frágeis.
O relatório mostra ainda que 27 dos 38 ataques cometidos desde 2011 foram planejados ou motivados em ambientes digitais. Plataformas como Instagram ou Discord, fóruns online, chats de jogos e aplicativos de mensagens se tornaram espaços de radicalização e difusão de discursos de ódio.
"Os adolescentes não necessariamente precisam estar envolvidos em grupos radiciais. Os discursos de ódio não atingem só as pessoas que estão nestes grupos. Já está no dia a dia. Esses meninos estão expostos em redes sociais e aos algoritmos", argumenta Garcia.
A BBC News Brasil procurou o Instagram para saber se a plataforma monitora palavras que indiquem ameaças de violência e como atua diante de possíveis planejamentos de crimes. Até agora, a empresa não respondeu à reportagem.
Em depoimento às autoridades, os envolvidos no ataque à professora em Caxias negaram influência de jogos eletrônicos ou filmes em suas ações. O que se sabe até agora é que eles jogavam juntos Free Fire — um jogo de celular em que os participantes travam batalhas online que envolve procurar armas e munição — e trocavam mensagens no chat do programa.
No dia seguinte ao ataque à escola João de Zorzi, as escolas municipais de Caxias do Sul ficaram vazias. A Prefeitura suspendeu as aulas da rede. Já os professores, comovidos com o episódio, saíram às ruas em solidariedade à colega, então hospitalizada.
O ato reuniu dezenas de educadores, vestidos de preto, em frente à Prefeitura da cidade. "Estamos desassistidos, exigimos respeito", lia-se em um dos cartazes na manifestação. "A violência não é acaso, é descaso."
Entre as reivindicações dos educadores, estavam o aumento da presença da Guarda Municipal (GM) e melhorias físicas nos prédios escolares, além de apoio psicológico contínuo, ações de prevenção à violência e valorização profissional.
Com 82 escolas de ensino fundamental geridas pela prefeitura e cerca de 47 mil alunos, apenas duas rondas escolares da GM fazem a patrulha das escolas — até mesmo das escolas rurais, que chegam a estar a 60 km de distância do Centro.
Questionada pela reportagem, a secretária municipal de Educação, Marta Fattori, afirmou à BBC News Brasil que o patrulhamento foi reforçado na João Zorzi e em outras unidades da região. Portões com campainha e botão de pânico também estão entre as medidas discutidas, e o colégio onde ocorreu o ataque já recebeu estes ajustes.
Na esteira da comoção, a Câmara Municipal de Caxias aprovou uma moção de apoio à proposta de mudar o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) e reduzir a maioridade penal, de 18 para 16 anos, que tramita no Congresso Nacional — um projeto do senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ). A moção obteve o apoio do prefeito de Caxias.
Pelo ECA, menores de 18 anos são penalmente inimputáveis — ou seja, considerados incapazes de responder pelos delitos como adultos. A medida mais grave da qual podem ser alvo, e que também deve ter caráter educativo, é a internação (privação de liberdade), que pode durar de seis meses a três anos, dependendo da gravidade da situação e da recuperação dos adolescentes.
Mesmo se a mudança no ECA fosse aprovada, no entanto, ela não poderia ser aplicada aos alunos da João de Zorzi, que têm idades entre 13 a 15 anos.
Uma mudança assim tampouco está entre os desejos de Luana, a professora que recebeu as facadas.
"Queremos a responsabilização desses adolescentes na forma como está prevista no ECA, nada mais e nada menos", afirma o advogado da vítima.
Para uma professora que deu aula para a Turma 71, a discussão desvia o foco, que deveria ser mais apoio especializado para professores, escola e adolescentes. "A gente se sente muito abandonado", desabafa ela que, por medo de represálias, pediu anonimato.
"Hoje a gente faz tudo: é assistente social, psicóloga, mãe", prossegue.
"Precisamos de professores motivados e valorizados. Precisamos de escuta acolhedora para o aluno. Talvez assim ele não vá surtar e chegar a esse ponto de querer esfaquear um professor."
O processo de apuração do ataque a escola de Caxias do Sul deve ser encerrado em até 45 dias, com o julgamento ou não dos adolescentes apreendidos por uma vara da Justiça dedicada à infância e à adolescência.
Além das medidas direcionadas aos autores do ataque, o advogado da professora também quer investigar a responsabilidade do município enquanto gestor da escola.
"Depois que as investigações de atos infracionais terminarem, vamos investir nessa investigação também em relação aos atos do município e buscar para ela uma justa reparação", disse o advogado.
"Não é um ato traumático que aconteceu naquela terça-feira e se encerrou. Ela está revivendo isso todos os dias. Esperamos que ela consiga melhorar para retomar a vida, mas hoje não temos sequer condições de afirmar que ela volte para uma sala de aula."
Foi pedido posicionamento ao Instagram sobre iniciativas de controle e contenção da disseminação de posts violentos através da plataforma. A BBC News Brasil não recebeu resposta da empresa até a publicação desta reportagem.
Fonte: g1