Depressão, ansiedade e distúrbios comportamentais estão entre as principais causas de doenças e incapacidades entre os adolescentes. Em todo o mundo, um em cada sete jovens de 10 a 19 anos enfrenta algum transtorno mental, de acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS).
O período de rápido crescimento e desenvolvimento faz com que a infância e a adolescência se tornem fases críticas para a saúde mental. As habilidades cognitivas, sociais e emocionais adquiridas nessa fase da vida podem moldar a saúde mental dos indivíduos na fase adulta.
A falta de atenção e cuidado com condições mentais nessa faixa etária pode levar a prejuízos futuros, incluindo limitações a uma vida plena. De acordo com a OMS, a qualidade do ambiente onde as crianças e os adolescentes crescem determina o seu bem-estar e desenvolvimento. Além disso, experiências negativas precoces em casa, no ambiente escolar ou espaços digitais, como exposição à violência, bullying e pobreza, aumentam o risco de transtornos mentais.
Distúrbios emocionais, como a depressão e a ansiedade, são comuns entre os adolescentes. Os transtornos de ansiedade são os mais prevalentes nessa faixa etária e são mais comuns entre os adolescentes mais velhos. Estima-se que 3,6% dos jovens de 10 a 14 anos e 4,6% dos de 15 a 19 anos sofram de um transtorno de ansiedade.
Já a depressão afeta cerca de 1,1% dos adolescentes de 10 a 14 anos e 2,8% daqueles entre 15 e 19 anos. Depressão e ansiedade compartilham alguns dos mesmos sintomas, incluindo mudanças rápidas e inesperadas de humor, que podem ser confundidos com comportamentos comuns dessa fase da vida.
No entanto, diferentemente de reações típicas da idade, a ansiedade e os transtornos depressivos podem afetar profundamente a atividade escolar, os relacionamentos e o convívio familiar.
Os médicos relatam consistentemente uma falta de confiança em sua capacidade de cuidar de adolescentes com depressão. Nesse contexto, pesquisadores do Canadá realizaram um estudo de revisão sobre o diagnóstico e cuidado da depressão nessa faixa etária.
Segundo a pesquisa, a prevalência de depressão entre adolescentes aumenta com a idade. Antes da pandemia de Covid-19, a prevalência de transtorno depressivo maior entre adolescentes era de cerca de 13% a 15%.
Uma análise recente apontou que cerca de 1 em cada 4 jovens apresentou sintomas depressivos clinicamente significativos durante a pandemia, com taxas mais altas associadas à idade avançada e ao sexo feminino.
O início da depressão antes da idade adulta está associado a uma maior gravidade da doença na idade adulta, com aumento no número de episódios depressivos, internações hospitalares e risco de autoagressão e suicídio, resultados piores de saúde física (incluindo obesidade, diabetes e doenças cardiovasculares), em relações sociais e ocupacionais.
A causa dos transtornos depressivos é multifatorial, incluindo fatores genéticos, ambientais e do próprio organismo de cada pessoa.
Familiares de primeiro grau de indivíduos com transtorno depressivo maior têm risco 2 a 4 vezes mais elevado de desenvolver a doença que a população em geral, segundo a Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP).
No contexto ambiental, são consideradas experiências adversas na infância, como um fator de risco em potencial. Experiências negativas de afeto também aumentam a probabilidade de episódios depressivos.
O estigma e as experiências de bullying têm sido associados ao aumento das taxas de depressão entre adolescentes LGBTQIA+. Dados dos Estados Unidos sugerem que a interseccionalidade entre raça e gênero exacerba a depressão.
A Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP) recomenda que os médicos pediatras investiguem questões relacionadas ao quadro comportamental e emocional da criança e adolescente. As consultas devem incluir conversas sobre estado de humor e sentimentos, além da observação de possíveis rotinas inadequadas ou de indicativos de estresse tóxico.
O diagnóstico da depressão deve ser realizado por profissionais especializados. Em geral, são considerados critérios presentes na 5ª edição do Manual de Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (chamado DSM-5).
Nesse contexto, os médicos devem considerar cinco ou mais sintomas (veja abaixo), presentes por pelo menos duas semanas e que representam mudanças na vida do adolescente. Entre as manifestações estão humor deprimido e perda de interesse ou prazer. O humor deprimido pode ser definido pela tristeza intensa e permanente, na maioria ou em diariamente, com sensação de vazio e falta de esperança.
Também são considerados para o diagnóstico da depressão em adolescentes os seguintes sintomas, quando intensos ou que se manifestam quase todos os dias:
No estudo canadense, os pesquisadores destacam que, em comparação com adultos com depressão, crianças e adolescentes podem ter maior probabilidade de apresentar irritabilidade e humor instável, em vez de deprimido, além de dificuldades de sociabilidade. Em comparação com crianças mais novas, os adolescentes são menos propensos a apresentar ansiedade, sintomas físicos, agitação psicomotora e alucinações.
Os especialistas defendem que a avaliação de risco é um componente crítico do diagnóstico da depressão. e inclui a revisão da intenção e plano suicida, além de critérios como desesperança recente, sobrecarga percebida e impulsividade, tentativas anteriores de suicídio e automutilação e fatores de estresse.
O estudo canadense faz uma revisão com base nas evidências mais recentes e nas diretrizes de prática clínica do Canadá, Estados Unidos, Reino Unido, Austrália e Nova Zelândia. Entre os tópicos principais estão pontos sobre diagnóstico, triagem e cuidado.
Diagnóstico: irritabilidade e humor triste ou deprimido, fadiga, distúrbios do sono, diminuição do prazer de atividades e dificuldade de concentração podem indicar o diagnóstico de depressão em adolescentes.
Triagem: embora sejam necessárias mais pesquisas sobre triagem universal para depressão adolescente na atenção primária, pode ser apropriada em alguns casos. Os médicos devem usar uma ferramenta de triagem validada e reconhecer que a triagem não substitui uma avaliação diagnóstica.
Cuidado: é necessária uma abordagem multifacetada, que pode incluir psicoterapia e medicação, bem como a abordagem dos fatores de estresse.
“A depressão é uma condição cada vez mais comum, mas tratável entre os adolescentes. Os médicos e pediatras da atenção primária estão bem posicionados para apoiar a avaliação e o tratamento de primeira linha da depressão neste grupo, ajudando os pacientes a recuperar sua saúde e função”, escrevem os autores.
Eles afirmam que pesquisas futuras são necessárias para abordar questões não respondidas, incluindo os efeitos da pandemia de Covid-19 na depressão, se a triagem universal melhora os resultados e como personalizar melhor o tratamento da depressão para otimizar a eficácia.
Fontes: Depressão na infância e adolescência, documento científico da Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP); Diagnosis and management of depression in adolescents, da Canadian Medical Association Journal.